A sessão decorreu no final de uma residência poética oferecida pela Câmara Municipal de Santo Tirso Santo Tirso, entre 16 e 20 de Março.
no Museu Nogueira da Silva.
Declaração da família sobre a data do seu nascimento (ler).
Ligação para a edição na INCM das suas obras completas.
Exposição do Centenário na Universidade do Minho (video).
Documentário O que vêem os anjos, uma ideia original de José Miguel Braga, em que também participei.
(para o nome da clara)
e de súbito, alado, seu nome erguia,
enquanto a noite em nós refluía,
o indomável fulgor da claridade
Metanoia, Leiria.
T1: que lume acenderei quando nem cinzas?
T2: o que o olhar não guarda é perda pura
T3: não é consolo o amor mas espessura
T4: a palavra que me habita é onde eu moro
T5: do teu rosto apenas sei que me reergue, do teu nome tão-só que o meu contém
houvesse nesta tarde um olhar intacto
onde ecoasse como então a tua voz:
era uma vez uma menina que vivia num palácio com vasos do japão
e recomeçasse em mim o lugar exacto
em que o medo era simples
(havia ainda azul)
e próxima ficava a tua mão
depois
inúmeras lágrimas cruzaram
a firme vontade que transportas
e secretas manhãs aqui voltaram
como se nunca tivessem sido mortas
cada desilusão foi uma força
cada percalço um recomeço
e não houve noites que longas soçobrassem
nem faltou o lume onde me aqueço
quando o pavor retoma este lugar
entre as infindáveis dissoluções dos dias
tua voz ainda enfrenta o tempo
uma menina, sabes, que brincava com a chuva nos corredores do vento
lembro-me de um anjo
flores secas
alguém que ao largo te acenou
sim ainda escuto o anjo
um anjo de louça que velou a madrugada
e de insuspeita glória te coroou
1.
nesse verão o dia era claro mesmo ao sol posto
e o mar alcançava-nos perto do peito
como uma pedra a abrir-se
repara:
ainda faltam quase todos na fotografia
(é um álbum novo quando agosto principia)
mas já seus olhos abrem
de mansinho
a madrugada de todas as promessas
ocupa, pois, sozinho o centro do retrato.
tão novos nós não supomos ainda
a erosão dos campos
nem o que faremos em cada encruzilhada
palavras dissolvidas, as mãos solventes.
por agora para ele conflui todo o olhar.
mais tarde colecionará bichos, piratas, cartomantes,
ondulações da voz, extra-terrestres, os dedos dos pinhais
e cães, claro, quando a noite chorar sobre a pele em brasa
germinará então a fotografia inteira
irá desdobra-la numa tarde enorme
e recolhê-la
como coisa sua que nos juntasse enfim
que nos fizesse casa
comum, por certo, para o mar que houvesse
já ele ali porém nesse verão distante
pequena evidência
que à luz nos devolve iluminados.
traz o dia pela trela
e o sol dobrava-se ao seu riso claro:
era uma vez um qué-qué ...
2.
tantos anos depois o qué-qué sem dar de si
um gato? uma praia? um fogo mudo?
um eco apenas desse mar varrido
quando a mão por fim se crispou voraz
e as minudências retomaram ferozes
seu caminho obscuro
3.
o que fecha a noite, sabes, quando sós por fim
não são epopeias nem tragédias, desígnios que houve
triunfos por haver,
sequer um grande amor dobrado sobre as pálpebras
o que nos roi é a mesa da cozinha,
a cadeira, o calendário
os ombros magoados contra a gaveta vazia
um pequeno cansaço matinal, repetido, insidioso
as horas calcificadas onde o vento apenas
o que nos roi são as ruas do costume
sua aspereza interior quando não chove
a contabilidade ávida e inútil onde as cores soçobram
as perdas se acumulam e delas próprias se perdem
recessivas
4.
envelhecemos de súbito tão larga a tua ausência
tua palavra rápida, genial, generosa
mas o qué-qué calado, não o encontro agora
tantos anos depois, sabes, o sol de luto
nossa idade inútil dobrada sobre o nada
o teu riso próximo a crescer em mim