luís soares barbosa
meu nome é ninguém
Publicado pela Officium Lectionis, em dezembro 2025

Imagem da capa: ilustração de Catarina Soares Barbosa [2025]

O livro glosa um breve poema de Emily Dickinson:

I’m nobody. Who are you?
Are you – Nobody – too?

Percorre com ele a multidão daqueles cujo nome é ninguém, sua vez e voz inexistentes. Mortos, violados, expulsos, torturados, humilhados, reduzidos a danos colaterais, soterrados sob as ruínas das suas vidas destruídas.

Cada poema tem, porém, um nome e um rosto. Rosto que se adivinha, nome que o procura resgatar do esquecimento. E inscreve-se ainda num lugar e no seu tempo, onde nomes e rostos soçobraram sob o manto nefasto da iniquidade. Por exemplo, Rafah, Lampedusa, Odessa, Palmira, Khan Yunis, Visigrad, Hebron, La Plata, Belfast, Goma, Beirute, Valparaíso, Tabriz, Homs, Santiago, Jenin, Cartum, Dzaipi, Lesbos, Calais, Kigali, Esmirna, Jabala, Pristina, Wiriamu, ou Gaza.

(observação e lamento no porto de sídon, quando o dia cai, junho, 2013.)

alguns esperaram, atónitos, a floração
das pedras.

outros sucumbiram ao seu travo amargo.

outros ainda colheram dos dias
as horas destruídas
e depuseram-nas vazias
no limiar do corpo.

cidades e portos se despiam
de quanto em si tiveram,
incluindo um ínfimo
entre mãos sem nome.

de cada um, só sua noite resta.

(retrato de Aram, o curdo, em frente ao tigre, no outono de 2016.)

Aram, o homem de olhos calmos,
aprendeu, sem surpresa, que o seu país era um delito
ao percorrer o medo
na penumbra.

ou terá sido antes,
quando ainda esperava um rosto proibido?

as veias dos seus pulsos traçaram caminhos
nas montanhas.