O Inventário dos Livros da Santa Casa da Misericórdia de Braga , existentes no Arquivo Distrital de Braga, que agora a Bracara Augusta publica, representa o fruto de um seminário de História da Idade Moderna, realizado na Faculdade de Letras do Porto, pelas alunas D. as Etelvina Martins de Faria, Maria Arminda Loureiro Machado, Maria da Assunção Cardoso Jácome de Vasconcelos e Maria do Carmo Sampaio dos Santos Palha, no ano lectivo de 1976-1977, sob a nossa directa orientação.

Este trabalho deve muito à intervenção esclarecida do Sr. P. e Dr. José Marques, distinto docente da Faculdade de Letras do Porto, diplomado com o Curso de Bibliotecário e Arquivista, e beneficiou do apoio do Centro História da Universidade do Porto onde dirigimos a investigação no campo da História Moderna.

Na procura, estudo e ordenamento sistemático das espécies catalogadas distinguiu-se, em primeiro lugar, a Sr.ª D.ª Etelvina Faria e depois a Sr.ª D.ª Maria da Assunção Jácome de Vasconcelos e as Sr. as D. as Maria do Carmo Sampaio dos Santos Palha e Maria Arminda Loureiro Machado, as quais constituíram um grupo coeso e activo que, ao longo de muitos e trabalhosos meses, demonstrou o que de útil se pode fazer num seminário virado para a pesquisa.

Na verdade, se não iniciaram a história da Misericórdia de Braga propriamente dita, prepararam os materiais para o estudo que, no futuro, poderá desvendar, desde as origens e nos seus múltiplos aspectos, os fastos da Misericórdia e, bem assim, o papel do Hospital de S. Marcos no transcurso dos séculos.

Trata-se duma tarefa que urge efectivar, tão relevante foi a acção dessas instituições no território de Braga e tão vasto se afirma o manancial que permite analisar as suas estruturas, funções, serviços, servidores e beneficiários, de par com a sua história patrimonial e financeira, todas elas inseridas e expressoras de omnímodas facetas da vida sócio-económica e mesmo eclesiástica regional.

Por outro lado, o labor concretizado obrigou a uma atenta consulta das espécies ordenadas, que se tornou mais acessível graças às facilidades dispensadas às estudantes pelo Director dos Serviços de Documentação da Universidade do Minho, Dr. Manuel Artur de Fraga Norton e à inapreciável colaboração e competência do funcionário Sr. Afonso.

Demais, a publicação do Inventário traduz o interesse que a Direcção da revista Bracara Augusta e o município de Braga continuam a votar aos problemas da cultura e à divulgação de elementos úteis que propiciem a investigação histórica no tocante à área bracarense.

Quer dizer, preparado na Faculdade de Letras do Porto por alunas braguesas, sob a égide de professores oriundos da cidade de Braga, o presentes trabalho fica a servir ao Arquivo Distrital, aliançado à Universidade do Minho e vem a lume na revista da Câmara Municipal, factos que, em conjunto, testemunham uma cadeia de solidariedade em torno do bom fruto amanhado e produzido por uma equipa de estudantes universitários.

Na sequência do Inventário de Livros , agora impresso, as mesmas alunas urdiram, durante o ano lectivo de 1977-1978, em grosso volume, o Inventário de Documentos Avulsos pertencentes à Santa Casa da Misericórdia de Braga e Hospital de S. Marcos .

A nosso ver, e a despeito de algumas imperfeições que não deslustram o teor dos resultados obtidos, o trabalho que hoje aparece e esse outro que a seu tempo será revelado, obrigam a que, no porvir, alguém escreva, segundo rigorosos e actuais critérios metodológicos, a história da Misericórdia de Braga, aspecto de uma história da cidade de Braga de que infelizmente carecemos, como, por igual, carecemos de obra de conjunto sobre o Entre Douro e Minho, isto num século em que a história regional e local assume um tão distinto e relevante lugar no âmbito da historiografia europeia.

Possa então o contributo do grupo de arquivistas e estudiosas da história, formado pelas Dr. as Etelvina Faria, Maria Arminda Machado, Maria da Assunção Vasconcelos e Maria do Carmo Palha, servir de estímulo à pesquisa sobre os fastos da nossa terra, ulteriormente estruturados não como memória saudosista de tempos mortos ou cristalizados, mas na consciência de que «comprendre son temps est impossible à qui ignore tout du passé; être un contemporain, c'est aussi avoir conscience des héritages, consentis ou contestés».

Ora, se hoje é irrefutavelmente certo que o tempo das Misericórdias passou, diluído pelas transformações sociais, pelas exigências globalizantes da saúde pública e muito pelo desenvolvimento tentacular do Estado moderno, não é menos certo, e constitui matéria de reflexão, que continua a faltar um serviço que as substitua no prestante apoio que, por muitos séculos, atómica e autonomicamente, realmente ofereceram à sociedade portuguesa. E a análise dos documentos agora inventariados há-de ilustrar bem tal verdade no que à Misericórdia de Braga diz respeito, outros sim revelando os problemas e as carências que no correr dos anos marcaram a sua existência.

É essa história, séria e desapaixonada, que se impõe fazer, é esse o repto que aqui deixamos a quantos, incrustados no mundo contemporâneo, se interessam pelo passado da nossa região, da nossa cidade, das instituições que em Portugal floresceram.


Porto, 20 de Julho de 1977

Luís A. de Oliveira Ramos

Professor da Faculdade de Letras do Porto